20.11.12

Amar sem sombras

"Esta é a história de uma mulher e de um homem que se amaram plenamente, salvando-se assim de uma existência vulgar. Eu a levei na memória conservando-a para que o tempo não a desgastasse e é só agora, nas noites silenciosas deste lugar, que finalmente posso contá-la. Eu o farei por ele e por outros que me confiaram suas vidas dizendo: toma, escreve, para que o vendo não as apague." - Isabel Allende

Eu já havia visto o filme baseado em De Amor e De Sombra, romance de Isabel Allende, algum tempo atrás. Confesso que não lembrava de muita coisa da história, mas, ao ver a edição "vira-vira" (2 livros em 1. O outro livro é A Casa dos Espíritos) na Livraria Saraiva, em Salvador, me senti tentada a comprar. E, sovina que sou, o preço foi ainda mais tentador: com o desconto, ficava por R$12,90.

Saí da livraria feliz, com o livro e um CD em mãos, achando que não poderia ficar melhor. Não é que ficou?

Quero avisar que De Amor e de Sombra é um romance nitidamente à esquerda. Por quê vejo o livro dessa forma? Primeiro, a biografia de Isabel Allende nos dá uma forte pista. Ela é sobrinha do ex-presidente chileno Salvador Allende e foi exilada por ocasião do golpe militar em seu país. Em segundo lugar, está a forma como o enredo é conduzido. O interessante e curioso é que Isabel Allende não cita o país onde a história se passa, mas várias pistas são dadas para que possamos concluir que esse lugar é o Chile.

Irene Beltrán é uma jovem jornalista, noiva de um capitão do Exército e alienada politicamente. Um dia, ela conhece Francisco Leal, que vai trabalhar como fotógrafo na redação que ela chefia. Eles decidem fazer uma reportagem sobre Evangelina Ranquileo, que mora em um pequeno povoado e é tida como uma santa, por realizar alguns milagres. Irene e Francisco vão até Los Riscos presenciar os feitos da garota e, nesse dia, os policiais chegam para prendê-la. E, puft, ela some. Os dois começam, então, a investigar o mistério do sumiço de Evangelina. Enquanto isso, envolvem-se cada vez mais e se apaixonam. E, olha, a paixão deles é algo lindo.

O pai de Francisco, para mim, é a maior prova do caráter ~subversivo~ do romance. Espanhol fugido do regime de Franco, o professor Leal era marxista e, após algumas desilusões com a URSS, torna-se anarquista. E ele é simplesmente um dos melhores personagens do livro. Já a mãe de Irene, Beatriz Alcantara, é descrita como uma mulher alienada, que não suporta a ideia de que seu marido, desaparecido, possa ter sumido por ser comunista. Em alguns pontos, tem-se a impressão de que ela é uma vilã, por embora De Amor e de Sombra não tenha, de fato, nenhum vilão a não ser a ditadura instalada no país.

Quando assisti ao filme, confesso que não havia entendido o que seriam as "sombras" do título. Após a leitura, tornou-se tão óbvio para mim que chega a ser vergonhoso eu não ter compreendido de início: as sombras são a ditadura, a repressão, a censura. Que todas as más experiências de uma ditadura sirvam de lição: quero um mundo de amor, sem sombras.

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